Quando o aplicativo foi bloqueado pela segunda vez no País, no início deste mês, muita gente entrou em pânico por não poder enviar e receber mensagens. Para algumas pessoas, porém, a aparente irritação escondia um problema ainda maior: o vício no WhatsApp
"As pessoas não estão conscientes de que estão se tornando viciadas no WhatsApp", afirma a psicóloga do programa de dependências tecnológicas do Hospital das Clínicas, Dora Goés. "O serviço é algo muito novo na vida delas e na sociedade, então é difícil ter noção disso tão rapidamente."
Até o momento, ainda não há um grande número de "viciados" em WhatsApp diagnosticados no Brasil. Apesar disso, segundo apurou o Estado, três dos principais centros de pesquisa em dependência tecnológica do País já atenderam pelo menos algum caso relacionado diretamente ao aplicativo de mensagens instantâneas
O perfil das pessoas dependentes do app de conversas, segundo os psicólogos, é de jovens de 18 a 30 anos. Eles estão em época de estudos ou no ápice de suas carreiras profissionais e o vício no aplicativo pode comprometer seu desempenho. "As pessoas substituem e perdem coisas da rotina para ficar usando o app", afirma a psicóloga do Núcleo de Pesquisas da Psicologia em Informática (NPPI) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Ana Luiza Mano. "Eles deixam de dormir, faltam na escola e no trabalho." De acordo com a avaliação, a pessoa pode ser encaminhada para um psiquiatra para tratamento ou, simplesmente, continua no grupo para receber uma educação digital.
"Grande parte da população brasileira usa a tecnologia de forma abusiva", afirma a psicóloga e fundadora do Instituto Delete, Anna King.
Detox sem internet pode ajudar
Como muita gente ainda não está ciente de que usa de maneira exagerada o WhatsApp, o número de pessoas que procuram tratamento ainda é mínimo, de acordo com os especialistas. Entre os principais sintomas do vício no app está a necessidade de checar continuamente as notificações e de responder imediatamente as mensagens.
Há diversos tratamentos para a dependência digital: desde um simples "detox" digital ou até mesmo terapia em grupo e com aconselhamento médico. No Hospital das Clínicas, por exemplo, o usuário passa por uma triagem para diagnóstico da dependência em tecnologia. Em caso afirmativo, ele inicia um programa de 18 semanas, no qual psicólogos avaliam a origem e nível do vício.
Quando o serviço do WhatsApp foi bloqueado no Brasil, não faltaram pessoas que buscaram outros aplicativos de mensagens, como o Telegram e o Messenger do Facebook. Mas, enquanto algumas pessoas não conseguem ficar um dia inteiro sem trocar mensagens, outras buscam certo ‘isolamento digital’ para resistir à tentação de pegar o smartphone sempre que uma notificação aparece. Para isso, nada melhor do que se instalar em um local distante, com belas colinas, muita vegetação e, o mais importante, sem sinal de internet.
Esta é a ideia do programa de desintoxicação digital oferecido pela agência de pesquisa em tendências Über Trends. De acordo com a coordenadora da iniciativa, Suzana Cohen, a ideia é fazer as pessoas desapegarem de seus dispositivos e renovarem as energias para uma vida offline.
Além de atividades como andar de caiaque, fazer caminhadas e observar as estrelas, o programa oferece cursos teóricos de conscientização sobre o uso adequado de novas tecnologias e avalia a ‘presença da pessoa no mundo virtual’. "Às vezes a pessoa só publica fotos com o copo na mão e não percebe que muitos podem achar que ela se tornou uma alcoólatra", diz Suzana
Embora conte com a participação de profissionais da área de psicologia, o programa não tem a intenção de servir como um tratamento médico. O "detox" digital é voltado para pessoas que começam a perceber que o uso excessivo de tecnologia pode ser a causa de problemas na vida familiar, afetiva e no trabalho.
Fobias e transtornos ocultos
O WhatsApp é o mais novo serviço a entrar para o rol dos que podem gerar dependência. O vício em games é um dos mais estudados e antigos e faz com que os usuários joguem sem parar, deixando de lado atividades sociais. Há casos de pessoas que morreram por não conseguir sair da frente da TV. O vício nas redes sociais Instagram e Facebook também tem sido amplamente estudado.
"O Facebook te pega no enredo do voyeurismo e da exibição porque cada um mostra a imagem de si projetada na rede que não necessariamente corresponde ao sentimento verdadeiro dela", afirma a fundadora da agência de pesquisa em tendências Über Trends, Suzana Cohen. "O Instagram é ainda mais egocêntrico."
Os estudos têm revelado que, por trás do vício em tecnologia estão fobias e transtornos psicológicos. É o caso do "fomo" (medo de estar perdendo algo, em inglês) e da nomofobia (junção da expressão "no mobile" e fobia, ou seja, medo de ficar sem celular). A dependência da tecnologia quase sempre também está ligada a outros distúrbios psicológicos, como depressão, ansiedade e compulsão. "Esses problemas acabam gerando um ‘vazio’ e as pessoas tentam preencher esse ‘buraco’ de maneira exagerada", diz Ana Luiza.
Primeiros sintomas
- Ansiedade exagerada quando fica sem bateria
- Incapacidade de se concentrar em qualquer outra coisa enquanto não ler as mensagens que estão chegando.
- Tendência a burlar regras (principalmente no trabalho), para olhar o celular e responder mensagens.
- Perda da noção de tempo
- O wifi liberado passa a ser o fator decisivo para escolha de um restaurante, lanchonete e outros ambientes. (Com Bem Paraná)