Com rede especializada, Estado garante educação para alunos hospitalizados

Uma aula de história com dois apaixonados pela investigação. De um lado, o professor da rede estadual de ensino do Paraná, Rudimar Bertotti, do outro, o aluno Eliel Davi Martins, do 6º de um colégio em Ponta Grossa.
Enquanto o professor fala sobre a importância da investigação dos fatos para conhecer e entender a história, Eliel, aos 10 anos, tem um sonho: ser cientista para investigar e descobrir a cura do câncer.
A aula com a troca entre professor e aluno só tem um detalhe: ela não acontece em uma sala de aula. Rudimar é um dos professores do Serviço de Atendimento à Rede de Escolarização Hospitalar (Sareh), coordenado pela Secretaria de Estado da Educação (Seed), e Eliel, trata uma leucemia linfoide aguda (LLA), descoberta algumas semanas depois que o garoto completou 10 anos em dezembro do ano passado.
O estudante é acompanhado pela equipe do Sareh desde a primeira etapa do tratamento em Curitiba, e agora retornou à escola em sua cidade, Ponta Grossa, onde vai seguir acompanhado pela equipe educacional (da escola de origem e do Sareh) até o fim do tratamento. Durante este período, caso precise ficar mais tempo em Curitiba, retorna para as aulas presenciais com a equipe do serviço estadual.
“Eu acordei no dia 10 de dezembro com muita dor no meu joelho e não passava, quase não conseguia andar”, relembra Eliel. Até o diagnóstico, houve piora no quadro e necessidade de internação, seguida da notícia da necessidade de mudança para a Capital. “Eu fiquei um pouco triste, mas sabia que era para o meu bem”.
Durante a primeira fase do tratamento, Eliel e seu pai foram recebidos na instituição APACN (Associação Paranaense de Apoio à Criança com Neoplasia), uma das 19 unidades, entre hospitais, comunidades terapêuticas e espaços de acolhimento, em todo o Estado no qual o Sareh trabalha para garantir o direito constitucional à educação das crianças e adolescentes.
Atualmente, 450 estudantes do 6º ao 9º ano e das três séries do Ensino Médio, continuam recebendo aulas nas unidades em que se recuperam.
“Desse cenário ruim e triste, de todas as restrições que o Eliel teve, o que deixou ele mais triste, foi a de que ele não poderia ir para a escola esse ano”, conta Luciano Martins, pai de Eliel.
Segundo ele, ao chegar em Curitiba para começar o tratamento e descobrir que o filho seguiria com as aulas por meio do Sareh, o momento foi de celebração. “Para ele foi uma alegria, uma maravilha. Ele fica ansioso para os dias de aula aqui. Além da importância de continuar os estudos e estar aprendendo, isso também ajuda o psicológico e o emotivo dele, contribui para um todo, diante da situação”, diz.
O pai conta que a vontade de ser cientista vem desde pequeno, mas ficou ainda mais forte depois que a mãe de Eliel lutou contra um câncer no intestino por três anos e faleceu há sete meses. “Ele diz que agora mais do que nunca ele vai ser cientista para descobrir a cura do câncer”, afirma.
Eliel, que diz gostar de matemática e inglês, mas emenda rapidamente que gosta de “todas as disciplinas”, enumera as razões pelas quais aprova as aulas do Sareh. “Eu me distraio e não fico pensando só no tratamento, eu consigo aprender e cada vez mais o tempo passa mais rápido para eu chegar perto de ir para casa”, planeja.
O professor Rudimar reconhece a dedicação de Eliel e explica que o Sareh proporciona um olhar específico para cada aluno, levando em consideração o momento pelo qual os alunos estão passando. “Neste atendimento, a gente avalia a situação de cada estudante. O Eliel, por exemplo, é muito avançado para a idade dele, então adaptamos as aulas para a etapa que ele se encontra. Mas já atendemos, por exemplo, um aluno que por conta de um tumor teve problemas motores e adaptamos todo o conteúdo fazendo o uso de outras ferramentas nas aulas”, conta.
ATENDIMENTO INDIVIDUALIZADO – O atendimento do Sareh acontece por meio de um termo de parceria assinado entre a Seed e a instituição que atende o estudante durante o tratamento de saúde. “É uma política do Estado do Paraná que apenas em 2024 atendeu 10 mil alunos. Os atendimentos são feitos sempre por uma equipe composta por um pedagogo e professores das áreas de Humanas, Exatas e Linguagens”, explica a coordenadora pedagógica de Educação Especial da SEED, Claudia Camargo Saldanha.
Atuando no Sareh como pedagoga há 17 anos, Elaine Marques, explica que os atendimentos são caso a caso, levando em consideração todo o aspecto psicológico que o aluno enfrenta durante o período de afastamento para tratamento de saúde.
“Primeiro fazemos uma sondagem para ver como esse aluno está, para entender em qual nível de conhecimento ele se encontra, independente da série. É a partir disso que vamos montar o plano de aulas, respeitando o momento dele. Normalmente o aluno em um período está no hospital ou recebendo a medicação, então é verificado se ao retornar, é possível manter as aulas no período contrário, levando em consideração a condição física e emocional do aluno”, detalha.
Segundo ela, todas as atividades são enviadas para a escola de origem, inclusive com sugestão de notas. “A sensação de pertencimento ao mundo escolar ajuda muito o estudante a perceber que ele não precisa interromper todos os seus sonhos, mostrando que é possível continuar seus estudos, priorizando a saúde, mas evoluindo, aprendendo e mantendo o vínculo com a escola e com os colegas. Escola é vida e isso para o psicológico e para o tratamento é muito importante”, salienta.
Embora o Sareh seja um serviço destinado aos estudantes da rede pública do Paraná, muitas crianças e adolescentes de outras localidades vêm ao Estado para o tratamento de saúde. “Quando isso acontece, nós também fazemos atividades com eles, com os nossos professores que atuam dentro das instituições parceiras, dentro das especificidades que cada aluno precisa”, detalha a coordenadora pedagógica da Secretaria da Educação, Claudia Saldanha.
É o caso da estudante carioca Bruna Fernandes Pinto de Oliveira, que tem 14 anos e está em Curitiba após passar por um transplante de medula para tratar de uma leucemia mieloide crônica, descoberta quando ela tinha apenas dois anos. “Minha mãe não pode estudar e sempre me aconselha a seguir estudando. Aqui eu gosto porque fica eu e a professora e ela pode me ensinar mais, na sala de aula são muitos alunos, fica difícil a atenção para uma aluna só. Eu já quis parar de estudar, sabe? Mas aí no hospital eu me mantive forte, porque passei por isso tudo, queria crescer, fazer minha faculdade, tudo”, reflete.
Os alunos são acompanhados pela equipe do Sareh durante todo o tratamento, mesmo em fases mais adiantadas, como a de manutenção, quando voltam aos hospitais/instituições para fazerem exames de rotina. Nestes casos, as aulas acontecem de maneira remota, para alunos do Paraná e de todo o Brasil.
Mais informações sobre o programa estão disponíveis neste site.
Por - AEN