"As perspectivas governamentais são boas. E mesmo a vacina contra o HPV sendo extremamente segura, ainda encontramos muita resistência a ela. São muitas as dúvidas dos pais, os boatos, ‘as lendas urbanas’... Os pediatras e os profissionais de saúde precisam dedicar grande parte do seu tempo esclarecendo os mitos relacionados às vacinas, incluindo a do HPV. Nesse processo de disseminação de informações, a parceria do Ministério da Saúde com as escolas é fundamental. Precisamos contar com a colaboração dos pais e dos educadores para conseguir alcançar a meta de vacinação contra o HPV, terceiro tipo de câncer que mais mata as mulheres no Brasil", afirma o pediatra e homeopata Moises Chencinski.
Câncer de colo de útero
A vacina contra HPV tem eficácia comprovada para proteger mulheres que ainda não iniciaram a vida sexual e, por isso, não tiveram nenhum contato com o vírus. Hoje, é utilizada como estratégia de saúde pública em mais de 50 países, por meio de programas nacionais de imunização. Estimativas indicam que, até 2013, foram distribuídas cerca de 175 milhões de doses da vacina em todo o mundo. A sua segurança é reforçada pelo Conselho Consultivo Global sobre Segurança de Vacinas da Organização Mundial de Saúde (OMS).
O câncer de colo de útero é o terceiro tipo de câncer que mais mata mulheres no Brasil, atrás apenas do de mama e de brônquios e pulmões. O número de mortes por câncer de colo de útero no país aumentou 28,6% em 10 anos, passando de 4.091 óbitos, em 2002, para 5.264, em 2012, de acordo com o Atlas de Mortalidade por Câncer no Brasil, publicação do Ministério da Saúde e do Instituto Nacional do Câncer (INCA).
"Tomar a vacina na adolescência é o primeiro de uma série de cuidados que a mulher deve adotar para a prevenção do HPV e do câncer de colo de útero. No entanto, a imunização não substitui a realização do exame preventivo e nem o uso do preservativo nas relações sexuais. O Ministério da Saúde orienta que mulheres na faixa etária dos 25 aos 64 anos façam o exame preventivo, o Papanicolau, a cada três anos, após dois exames anuais consecutivos negativos", afirma o médico.
Para acabar com qualquer dúvida sobre esse assunto tão importante, separamos alumas das principais questões levantadas nos consultórios médicos, confira:
1. Além de vacinar minha filha, como ela pode se prevenir contra a infecção do HPV?
De acordo com o médico Moises Chencinski, a transmissão do HPV se faz por contato direto com a pele ou mucosa infectada. Na maioria das vezes (95%), é transmitido através da relação sexual, mas em 5% das vezes poderá ser através das mãos contaminadas pelo vírus, objetos, toalhas e roupas, desde que haja secreção com o vírus vivo em contato com a pele ou mucosa não íntegra. As medidas de prevenção mais importantes são:
Uso do preservativo (camisinha) nas relações sexuais. É importante ressaltar que o seu uso, apesar de prevenir a maioria das DSTs, não impede totalmente a infecção pelo HPV, pois, frequentemente as lesões estão presentes em áreas não protegidas pela camisinha. Na presença de infecção na vulva, na região pubiana, perineal e perianal ou na bolsa escrotal, o HPV poderá ser transmitido apesar do uso do preservativo. A camisinha feminina, que cobre também a vulva, evita mais eficazmente o contágio se utilizada desde o início da relação sexual;
Evitar ter muitos parceiros ou parceiras sexuais;
Realizar a higiene pessoal;
Vacinar-se contra o HPV.
2. Como a vacina HPV funciona?
Estimulando a produção de anticorpos específicos para cada tipo de HPV. O especialista diz que a proteção contra a infecção vai depender da quantidade de anticorpos produzidos pelo indivíduo vacinado, a presença desses anticorpos no local da infecção e a sua persistência durante um longo período.
3. A vacina HPV pode causar infecção pelo vírus? Como ela é feita?
Não. No desenvolvimento da vacina quadrivalente conseguiu-se identificar a parte principal do DNA do HPV que o codifica para a fabricação do capsídeo viral (parte que envolve o genoma do vírus). Depois, usando-se um fungo (Sacaromices cerevisiae), obteve-se apenas a "capa" do vírus, que em testes preliminares mostrou induzir fortemente a produção de anticorpos quando administrada em humanos. Essa "capa" viral, sem qualquer genoma em seu interior, é chamada de partícula semelhante a vírus (em inglês, vírus like particle – VLP). Chencinski explica que o passo seguinte foi estabelecer a melhor quantidade de VLP e testá-la em humanos, na prevenção de lesões induzidas por HPV. No caso das VLP, elas imitam o HPV, fazendo com que o organismo identifique tal estrutura como um invasor e produza contra ele um mecanismo de proteção.
4. Por que o Ministério da Saúde estabeleceu a faixa etária de 9 a 13 anos para a vacinação?
Nas meninas entre 9 e 13 anos não expostas aos tipos de HPV 6, 11, 16 e 18, a vacina é altamente eficaz, induzindo a produção de anticorpos em quantidade dez vezes maior do que a encontrada em infecção naturalmente adquirida em um prazo de dois anos. Moises explica que a época mais favorável para a vacinação é nesta faixa etária, de preferência antes do início da atividade sexual, ou seja, antes da exposição ao vírus. Estudos também verificaram que nesta faixa etária a vacina quadrivalente induz melhor resposta quando comparada em adultos jovens, e que meninas vacinadas sem contato prévio com HPV têm maiores chances de proteção contra lesões que podem provocar o câncer uterino.
5. Quantas doses são necessárias para a imunização?
"O esquema completo de vacinação é composto de três doses. O esquema normal da vacina (0, 2 e 6 meses) é 1ª dose, 2ª dose após dois meses e 3ª dose após seis meses. No entanto, o Ministério da Saúde adotará o esquema estendido (0, 6 e 60 meses): 1ª dose, 2ª dose seis meses depois, e 3ª dose cinco anos após a 1ª dose", fala Chencinski.
6. A proteção da vacinação dura a vida toda?
O especialista salienta que a duração da imunidade conferida pela vacina ainda não foi determinada, principalmente pelo pouco tempo em que é comercializada no mundo (2007). Até o momento, só se tem convicção de próximo de 9 anos de proteção. Na verdade, embora se trate da mais importante novidade surgida na prevenção à infecção pelo HPV, ainda é preciso aguardar o resultado dos estudos em andamento em mais de 20 países para delimitar qual é o seu alcance sobre a incidência e a mortalidade do câncer do colo de útero, bem como fornecer mais dados sobre a duração da proteção e necessidade de dose(s) de reforço.
7. A vacinação contra HPV substituirá o exame de Papanicolau?
Não. É importante lembrar que a vacinação é uma ferramenta de prevenção primária e não substitui o rastreamento do câncer de colo de útero em mulheres na faixa etária entre 25 e 64 anos. Assim, as meninas vacinadas só terão recomendação para o rastreamento quando alcançarem a faixa etária preconizada para o exame Papanicolau e já tiverem vida sexual ativa. É imprescindível manter a realização do exame preventivo (exame de Papanicolau), pois as vacinas protegem apenas contra dois tipos oncogênicos (causadores de câncer) de HPV, responsáveis por cerca de 70% dos casos de câncer do colo de útero. Ou seja, 30% dos casos de câncer causados pelos outros tipos oncogênicos de HPV vão continuar ocorrendo se não for realizada a prevenção secundária, ou seja, pelo rastreamento (exame Papanicolau).
8. Em quanto tempo são esperados os efeitos da vacinação na redução das lesões, da incidência do câncer do colo de útero e na mortalidade pela doença?
Os efeitos na redução da incidência do câncer de colo de útero e da mortalidade pela doença serão observados a longo prazo, em torno de dez a quinze anos após o início da vacinação. No caso das verrugas genitais, que possuem período de incubação curto, é possível verificar o efeito em menor tempo. Na Austrália, país que implantou a vacina HPV quadrivalente em 2007, após quatro anos, foi observada redução significativa das verrugas genitais, com seu quase desaparecimento em mulheres menores de 21 anos.
9. Alguns pesquisadores defendem a vacinação de meninos. Por que o Ministério da Saúde não incluiu os homens na estratégia de vacinação?
Como o objetivo desta estratégia de vacinação é reduzir casos e mortes ocasionados pelo câncer do colo de útero, a vacinação será restrita ao sexo feminino. Estudos comprovam que os meninos passam a ser protegidos indiretamente com a vacinação no grupo feminino (imunidade coletiva ou de rebanho), havendo drástica redução na transmissão de verrugas genitais entre homens após a implantação da vacina HPV como estratégia de saúde pública. Mas a vacina já é licenciada no Brasil para meninos, apenas não sendo beneficiados pela campanha.
10. A vacina HPV pode ser administrada concomitantemente com outra vacina?
"A vacina HPV pode ser administrada simultaneamente com outras vacinas do Calendário Nacional de Vacinação do PNI, sem interferências na resposta de anticorpos a qualquer uma das vacinas. Quando a vacinação simultânea for necessária, devem ser utilizadas agulhas, seringas e regiões anatômicas distintas", diz.
11. A vacina HPV provoca algum efeito colateral (evento adverso)?
A vacina HPV é uma vacina muito segura, desenvolvida por engenharia genética, com a ocorrência de eventos adversos leves como dor no local da aplicação, inchaço e eritema. Em casos raros, pode ocasionar dor de cabeça, febre de 38 °C ou mais e síncope (ou desmaios). A síncope mais frequente em adolescentes e adultos jovens é a síncope vasovagal, particularmente comum em pessoas com alguma particularidade emocional. Geralmente, há algum estímulo desencadeante como dor intensa, expectativa de dor ou um choque emocional súbito. Vários fatores, tais como jejum prolongado, medo da injeção, locais quentes ou superlotados, permanência de pé por longo tempo e fadiga, podem aumentar a probabilidade de sua ocorrência. É importante ressaltar que a ocorrência de desmaios durante a vacinação contra HPV não está relacionada à vacina especificamente, mas sim ao processo de vacinação, que pode acontecer com a aplicação de qualquer produto injetável (ou injeção).
12. Em quais situações a vacina HPV não deve ser administrada?
A vacina HPV é contraindicada e, portanto, não deve ser administrada nas adolescentes com:
Hipersensibilidade ao princípio ativo ou a qualquer um dos excipientes da vacina;
História de hipersensibilidade imediata grave à levedura;
Que desenvolveram sintomas indicativos de hipersensibilidade grave após receber uma dose da vacina HPV;
Gestantes, uma vez que não há estudos conclusivos em mulheres grávidas até o presente momento. Se a menina engravidar após o início do esquema vacinal, as doses subsequentes deverão ser adiadas até o período pós-parto. Caso a vacina seja administrada inadvertidamente durante a gravidez, nenhuma intervenção adicional é necessária, somente o acompanhamento pré-natal adequado. (Com Bonde)