Esta brusca diminuição de desejo pode estar atrelada ao mito que confunde sexo com reprodução, querendo enterrar o sexo na mesma cova que encerra a menstruação e a reprodução. A fertilidade sempre foi louvada e até idolatrada.
Com a menopausa (última menstruação), cessa a fertilidade, e para muitas mulheres inicia-se um declínio na vida sexual devido ao preconceito. Ora, sexo-reprodução é apenas uma forma de ver a questão. O sexo-prazer é uma dádiva divina para ser desfrutada por toda a vida.
Muitas mudanças acontecem na vida pessoal e familiar nesta época que podem interferir na vida sexual, como, por exemplo, uma consciência muito clara da finitude da vida. Ocorre também um ''balanço'' de tudo o que foi ou deveria ter sido feito. Há a saída definitiva dos filhos de casa, o que sugere um certo abandono e a possibilidade de netos, que trazem à consciência a figura de avós ''fantasiados'' como velhinhos inválidos.
Assaltam pensamentos de inadequação e incapacidade de satisfazer os desejos do parceiro. Em resumo, se o sexo não foi bem desfrutado e amadurecido por um casal que sempre cultivou sua vida íntima - dando e recebendo generosamente, namorando sempre, apesar todas as tentativas familiares e sociais de dessexualizá-los - então esta mulher ''mal-amada'' acabará sentindo o peso de todas as mudanças próprias do climatério, e o resultado é uma menopausa cheia de calores, irritabilidade, depressão, dores na relação, desejo baixo, entre outros fatores.
Mas se a vivência sexual tem uma história pautada por momentos de prazer, em que os amantes se desejam e se entregam em deliciosos e inebriantes êxtases (orgásmicos ou não), a mulher passará suavemente por mais este degrau de sua vida, havendo um verdadeiro florescer da sexualidade, pois o casal volta a ter tempo para o outro, e vive sem as preocupações de uma gestação não planejada.
Este pode ser um período de muita criatividade e crescimento cultural e afetivo. Com a real valorização dos sentimentos próprios, há uma descoberta madura das qualidades do outro e uma parceria sem precedentes toma o lugar da superficialidade e rasura do passado.
Por Calvino Coutinho Fernandes, ginecologista e terapeuta sexual
Fonte - Folha de Londrina