Uma menina de três anos não deveria morrer. Só deveria brincar, sorrir, pular, ver desenho animado na tevê comendo chocolate e conversar com suas bonecas ou com seus amigos imaginários utilizando seu dialeto peculiar.
Mas a pequena Laura não teve chance de ser feliz. Foi vítima de uma covardia, uma brutalidade. Viveu pouco e sofreu demais. Não recebeu o carinho e a proteção de quem deveria zelar pela sua integridade e segurança. Tiraram da Laurinha o direito de conhecer o mundo. De se encantar com um pôr do sol, um arco-íris. De tomar banho de mangueira, banho de mar. Não deram à Laura o direito de chegar à adolescência e de achar nós adultos todos uns insuportáveis. De dormir na casa de uma amiguinha e ficar acordada até de madrugada conversando com ela. De correr, cair e ralar o joelho, apenas porque isso é uma coisa que criança faz quando corre e brinca muito.
De sentir o dente permanente crescer e cobrir aquela janelinha que o dente de leite deveria ter deixado. De sair para dançar, de namorar, descobrir o primeiro amor. De ter um filho para amar e cuidar. De ter o direito de estudar, de fazer uma faculdade e de adquirir conhecimento para querer mudar o mundo para melhor.
Mas não. Laura teve sua vida interrompida de uma forma torpe. Foi subjugada por alguém que achou que podia controlar as vontades dela. Mas ela era só uma criança, que mal sabia o que era certo e o que era errado. Desprovida de malícia e que, com apenas três anos, já vivia seu calvário particular.
No dia em que a Laurinha teve seus órgãos coletados para salvar outras vidas, eu dava banho na minha filha de dois anos. Olhei pra ela, que ria e espalhava água pela banheira cheia de espuma. Naquele momento eu desejei que a Laura pudesse estar ali também.
Ela deveria viver aquele momento, aquele pequeno átimo que talvez não tenha conseguido viver em três anos. Laura Beatriz Cardozo não merecia ter sofrido o que sofreu. Assim como não deveria ser uma mera questão de merecimento ou de sorte a minha filha estar cercada de carinho. Simplesmente porque elas são crianças. Todas elas merecem. Elas não pediram para vir ao mundo. E cabe a todos nós a responsabilidade de garantir que elas possam fazer suas escolhas com liberdade.
O mundo não foi justo com a Laurinha. Desculpe, menina. Nós não te merecemos.
Por Eduardo Mira